sexta-feira, 30 de abril de 2010

cebolas...

“haverá coisa mais normal, mais banal, mais igual a todo mundo, mais previsível, que oferecer um buquê de rosas? com um buquê de rosas estou dizendo: ‘você é igual a todas as outras’. para todas as outras ofereci buquê de rosas. e todas elas disseram e fizeram o que você fez agora. disseram: ‘que lindas’. e cheiraram as rosas. mas se eu desse um buquê de cebolas – que ela receberia com uma risada, sem cheirar – ela saberia que eu lhe estava dizendo: ‘você não é igual às outras. você leu pablo neruda”.
claro que o pai dela ficaria furioso, tentaria me expulsar da casa, por aquele gesto ofensivo, grosseiro. cebolas são entidades malcheirosas, culinárias, eu estava chamando sua filhinha de cozinheira. coitado. normal. literal. via do jeito como todo mundo via. estava de posse de sua razão. não lia pablo neruda. só lia os jornais, via o jornal nacional, usava cueca branca, pijama de bolinha, no restaurante sempre pedia o mesmo prato, não levava a mulher ao motel, e fazia romaria a aparecida. comia tédio como gosto. todo mundo come. é o normal...”
(rubens alves, em “cenas da vida”, referindo-se à “ode à cebola”, de neruda)

quinta-feira, 29 de abril de 2010

acordes

a gente não quer acorde suspense,
a gente quer acorde de tônica
porque ele é repouso,
e tensão é dúvida

em relação de dois
nunca vai haver certeza
assim, é bom é a tônica
ela é lugar de descanso...

quarta-feira, 28 de abril de 2010

menos estúpidas...

"eu queria que as pessoas fossem mais felizes... que fossem menos estúpidas. as pessoas são muito estúpidas e isso daí fere a alma da gente"
(norma bengell)

sábado, 24 de abril de 2010

sétimo selo

"o amor é a pior das pestes, mas morrer de amor seria um prazer.
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- nunca para de questionar?
- nunca vou parar.
- mas não tem respostas!
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- o que ela vê?
um anjo, o diabo, deus ou é apenas o vazio? o vazio...
- não pode ser.
- veja os olhos dela. ela está descobrindo algo. o vazio sob a lua.
- não.
- estamos impotentes... pois vemos o que ela vê e tememos o mesmo.
- ... não posso suportar!"
(o sétimo selo, filme de ingmar bergman, suécia, 1956)

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um filme que se dá a ousadia de falar do amor, do real, do vazio, da morte e da angústia.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

mary e max

"...queria que ele passasse mais tempo com ela, e menos com seus amigos mortos...
... sua mãe havia lhe dito que ela tinha sido um 'acidente'. como alguém pode ser um acidente?

...ele não conseguia entender porque ele era visto como diferente, enquanto todos os outros eram considerados normais...
ele concordava com seu físico favorito, de que existem apenas duas coisas infinitas: o universo e a estupidez humana...

... apesar de ter alcançado todos os objetivos de sua vida... ainda se sentia incompleto...

... você pode me explicar o amor e como eu posso ser amada?
... se ao menos houvesse uma equação matemática para o amor...
... ele sentia o amor, mas não sabia articulá-lo...

...a verdadeira amizade é vista com o coração, não com os olhos...
você não é perfeita. você é imperfeita igual a mim. todos os seres humanos são imperfeitos... ele disse que eu teria que aceitar meus defeitos e tudo mais, e que nós não escolhemos nossos defeitos; eles são uma parte de nós e temos que viver com eles. podemos, no entanto, escolher nossos amigos..."
(mary e max, direção e roteiro de adam elliot, baseado em uma história real...
filme lindo, delicado, humano e desidratante...)

quinta-feira, 22 de abril de 2010

nunca mais?

e ainda duvidam da sabedoria infantil, rs...
bárbaro isso! eu tinha que postar!
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boa semana (começa hoje, né? quinta-feira) ;-)

quinta-feira, 15 de abril de 2010

hamlet e o édipo

está em cartaz no club noir uma montagem adaptada de hamlet. essa foi a terceira ou quarta peça que vi no noir, e confesso que geralmente as peças lá vistas e dirigidas pela premiada juliana galdino me causam um certo estranhamento, um sensação oscilante de gosto e desgosto... mas o que quero contar nesse momento é sobre a ousadia dessa montagem de hamlet, e mais especificamente das cenas que remetem, aliás, escancaram o édipo. em um dado momento, a plateia é convidada por uma até então curiosa figura (o burro, do inconsciente de hamlet), a pensarem na morte do pai, do próprio pai, dada a argumentação que nenhuma cena ou imagem seria capaz de retratar o que isso pode mobilizar. e dado o convite, na penumbra, durante cerca de um minuto, a plateia se coloca diante da morte do pai em seus pensamentos... ao menos é esse o ousado convite. as cenas são retomadas... e dada a já sabida morte do pai, eis que o filho e a mãe encontram-se diante do desejo. ora, e como não há nada mais angustiante que encontrar o desejo, eis que torna-se inevitável, aos até então esquivos da morte do pai, a sensação da angústia ao deparar-se com a presença total da mãe. já sem o pai, que simbolicamente é quem alimenta a ilusão de intervir o sujeito entrar em contato com o objeto de gozo, com a invasão da "coisa" da mãe, eis que é literalmente gritante a angústia e consequentemente a tentativa de acabar com o objeto causa de angústia, isto é, a falta da falta.
(texto: fernanda pereira)
(foto: hamlet, club noir)

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aos apetecidos, fica a dica, hamlet, club noir, rua augusta, 331, sextas e sábados 21h e domingos 20h, até 23 de maio.
texto de roberto alvim e direção de juliana galdino

felicidade, obrigada...

“[...] tem-se uma concepção que faz da felicidade mais uma obrigação do que uma possibilidade que se experimenta vez ou outra no laço com o outro. cabe indagar como seria o laço entre pessoas que fazem da felicidade uma obrigação, em vez de apenas uma possibilidade surgida aqui e ali. uma das consequências não seria a ...dificuldade de conviver com a dor alheia? outra conseqüência possível seria fazer desse imperativo da felicidade uma justificativa para a excessiva medicalização da vida, na qual toda tristeza tende a ser tratada como depressão e motivo para se tomar remédio [...] aliás, parafraseando os irmãos coen, num mundo em que se é obrigado a se dar bem e a ser feliz, os fracos não tem vez”.
(eduardo furtado leite, psicanalista. “é possível falar em novas formas de perversão”. na revista cult, ano 13. 144).
(figura: vicente van gogh. l'arlésienne, 1888)

sábado, 10 de abril de 2010

abraçar é preciso

"este teu monitor é o quadrado mundo que impede o navegante de ir além-mar. fosse redondo eu poderia entrelaçar os meus dedos nos teus ou, quem sabe, buscar o horizonte onde divisam teus olhos. mas nem os olhos me fariam alcançar, pois como as vidas, escondidas, que amanhecem e entardecem além do olhar, um abraço não se enxerga e sonhos um olhar não conta. ao mundo que ultrapassa o além-mar dos teus olhos: abraçar é preciso."
(rita apoena)

sexta-feira, 9 de abril de 2010

"com" o tempo...

"quem tem olhos pra ver o tempo soprando sulcos na pele
soprando sulcos na pele soprando sulcos?

o tempo andou riscando meu rosto
com uma navalha fina

sem raiva nem rancor
o tempo riscou meu rosto
com calma

(eu parei de lutar contra o tempo
ando exercendo instantes
acho que ganhei presença)

acho que a vida anda passando a mão em mim.
a vida anda passando a mão em mim.
acho que a vida anda passando.
a vida anda passando.
acho que a vida anda.
a vida anda em mim.
acho que há vida em mim.
a vida em mim anda passando.
acho que a vida anda passando a mão em mim

e por falar em sexo quem anda me comendo
é o tempo
na verdade faz tempo mas eu escondia
porque ele me pegava à força e por trás

um dia resolvi encará-lo de frente e disse: tempo
se você tem que me comer
que seja com o meu consentimento
e me olhando nos olhos

acho que ganhei o tempo
de lá pra cá ele tem sido bom comigo
dizem que ando até remoçando”
(viviane mosé, sequência “poemas tempo”, sem título. do livro “pensamento chão”, 2001)