segunda-feira, 26 de julho de 2010

re.lação

"amamos quando desconhecemos e nos desconhecemos; quando nos sentimos a mercê de uma alteridade inquebrantável; quando outro pode com um, mas não porque nos força a partir da sujeição e da violência, e sim a partir do encantamento".
(filósofo santiago kovadloff, 2003 apud psicanalista claudio césar montoto, 2005)
(desenho: fernanda pereira, "re.lação", da série arte sensível primitiva)

quinta-feira, 22 de julho de 2010

psicanálise

“na fundação da associação psicanalítica internacional, em 1910, freud anunciou aos colegas: ‘os indivíduos aos quais fazemos descobrir o que recalcam experimentam hostilidade a nosso respeito; não podemos esperar uma amabilidade simpática da sociedade para com aqueles que desvelam impiedosamente seus defeitos e insufi...ciências’. em carta a arthur schnitzler, ainda escreveria que a psicanálise não é ‘um meio de se fazer amar’.
devemos esperar, por isso, de tempos em tempos [...] ocasiões para mais uma vez se falar em ‘crise da psicanálise’, o que jacques lacan (1901-1981), já em 1974, refuta com vigor, em termos definitivos: ‘a crise... não existe. a psicanálise ainda não encontrou seus próprios limites. há muito que descobrir na prática e no conhecimento. em psicanálise não há solução imediata, mas apenas a longa e paciente busca das razões’. além disso, há freud, arremata lacan, ‘que ainda não compreendemos inteiramente’"
(fernando aguiar, “ainda é preciso ler freud”. revista cult, n. 147, dossiê freud).

terça-feira, 20 de julho de 2010

muito grata...



hoje e em tantos outros dias é bom momento para contar como me sinto uma sujeita abençoada. ainda que ensaios de tristeza às vezes se façam presentes, não ouso ficar muito da queixosa, afinal sempre posso sorrir quando lembro do tanto de gente linda e que amo tanto, pertinho de mim... e para melhorar o que já é bom... ainda consigo surpreender-me com tanto que me ocorre, com as surpresas boas que aparecem... dá prazer acordar para saber o que o dia reserva... e reservo-me para ele... e para os bons afetos, e os bons amores... obrigada, vissê... tenho um tanto a agradecer!
(desenho: "queria ter dois corações - um pra te amar e o outro também", de fernanda pereira, título de arthur dantas, da série "arte sensível primitiva")

sexta-feira, 16 de julho de 2010

"eu quero é passar com elas..."


"estou cansado e você também
vou sair sem abrir a porta
e não voltar nunca mais
desculpe a paz que lhe roubei
e o futuro esperado que nunca lhe dei
é impossível levar um barco sem temporais
e suportar a vida como um momento além do cais
que passa ao largo do nosso corpo
não quero ficar dando adeus
as coisas passando
eu quero é passar com elas
e não deixar nada mais do que cinzas de um cigarro
e a marca de um abraço no seu corpo
não, não sou eu quem vai ficar no porto chorando
lamentando o eterno movimento dos barcos"
(movimento dos barcos, jards macalé e capinam, 1972)

terça-feira, 13 de julho de 2010

bilhete de moça

"antes mesmo que acabasse o baile, maria adelaide dizia à mãe que não queria ficar um minuto mais que fosse.
— que é isso? disse-lhe a mãe. deu uma hora agora mesmo.
— não quero saber. vamo-nos embora.
— ora, meu deus!
— vamos, vamos.
não havia que dizer, a mãe era governada pela filha, e perderia o lugar no céu, se tanto fosse preciso, para não desgostá-la. note-se que não cedia pouco desta vez; cedia a ceia, que era excelente, e a boa viúva professava esta filosofia: — que as ceias excelentes são preferíveis às boas, as boas às más e as más às que não têm existência. sacrificava a melhor parte do baile; mas, enfim, contanto que a filha não padecesse.
padecer, padecia. no carro, logo que as duas entraram, maria adelaide começou a ralhar com tudo, com o carro, com a capa, com o calor, com o pó, com a mãe e consigo mesma. a mãe entendeu logo: era algum desgosto que o chico alves lhe dera. realmente, lembrou-se que o chico alves, indo despedir-se delas, nem alcançou que maria adelaide olhasse para ele. a moça deu-lhe os dedos, a pontinha apenas, e falou-lhe de costas; naturalmente estavam brigados.
a viagem foi atribulada. nunca o mau humor da moça foi tamanho nem tão explosivo. a mãe pagou pelo namorado, mas como era prudente e estava com fome, preferiu não dizer nada.
em casa, continuou o mau humor. a pobre criada da moça padeceu como nunca. maria adelaide entrou para os seus aposentos, furiosa, despiu-se às tontas, dizendo coisas duras, rasgando uma das mangas do vestido, atirando as flores ao chão, raivosa e indignada sem causa aparente. no fim, disse à criada que se fosse embora, e ficando só rebentaram-lhe as lágrimas. assim mesmo sozinha, ia falando, mordendo os lábios, dando punhadas no joelhos. depois arrancou da cadeira, foi à secretária e escreveu este bilhete:
'nunca pensei que o senhor fosse tão pérfido. nunca imaginei que pudesse proceder como fez no baile; creia que não manifestei o meu desgosto, por dois motivos: — o primeiro, porque ainda tive força de me dominar; segundo, porque depois do que o senhor me fez, nada pode haver mais entre nós. case-se com a viúva, se quer. mande as minhas cartas e adeus. esta determinação é irrevogável. qualquer tentativa de reconciliação obrigar-me-á ao que não quero'.
tinha dado expansão à cólera, deitou-se para dormir. o sono não veio logo; a raiva agitou a pobre moça, e só quando começou a madrugada foi que ela pôde dormir um pouco. no dia seguinte, o chico alves recebia este bilhete:
'desculpa algumas palavras que te disse ontem no baile. estava muito zangada. vem hoje tomar chá, e eu te explico tudo'.
fim de um bilhete"
(um bilhete, machado de assis, publicado em "a estação", 1885)

sexta-feira, 2 de julho de 2010

você está aí?

"o desejo é um tempo parado
é quando se trocam as datas dos bichos e das flores
é quando aumenta a rachadura da velha parede
é quando se vira a folha, a folha da história
é quando se pinta um fio branco na cabeleira preta
é quando se endurece o rastro de sorriso
no canto dos olhos
eu sei que a viagem é longa
a voz vai e vem
você ta aí?
você ta aí?
ei, você está aí?
vontade de abraçar o infinito"
(lirinha, "meu mundo dança", álbum "hoje acordei de sonhos intranquilos", de otto)

link música: http://www.radio.uol.com.br/musica/otto-e-lirinha/meu-mundo-danca/210474

quinta-feira, 1 de julho de 2010

você abusou...

primeiro samba que escutei em minha vida, em minhas recordações.
lembro que quando nina... bem nina mesmo, uma infante, pedacinho de carne... ouvia o vinilzinho joão carlos e jocafi, daqueles com uma ou duas músicas em cada lado... e a reação era rir e rir... ele estava lá, entre os vinis das fábulas infantis... mas nada me fazia rir mais (até porque as fábulas infantis não são sempre tão risonhas) que o tal vinil de antonio carlos e jocafi cantantes de "você abusou"...
já grandinha, na versão quase adulta, ouvi e reconheci com espanto a tal música da infância, já na voz de vinicius e maria creuza...
a parte menos engraçada, é que quando crescemos, e entendemos o significado das coisas, e sobretudo nos identificamos com elas, nem sempre a reação é "rir", é justamente o oposto...
mas vá lá... vinícius diz né "mas tem que sofrer, mas tem que chorar"... não acho isso negativo como alguns supõem. acho da ordem do humano... pessoas sentem dor, pessoas choram... também pessoas sambam e pessoas sorriem... e vivemos cada dia para a surpresa de cada instante... e saber que "vai passar", tanto o triste quanto o feliz, faz com que cuidemos um tanto mais do nosso presente, que é de fato o que temos... e que cuidemos com o carinho merecido de nós mesmos e daqueles com quem queremos dormir e acordar e saber que estão juntos... para tomar café da manhã, para jantar, para ir na peça da esquina, no lançamento do wood allen, no sofá com filme e pipoca, na sopa quentinha no frio, nos quadris para dançar, nos ombros para chorar e nas bocas para sorrir...