quinta-feira, 21 de janeiro de 2010
do desejo...
hoje, na tardinha, estava sentada, eu e meia dúzia de moços e moças mais uma platéia cheinha de senhorinhas e senhorinhos, super terceira idade... estavamos lá, esperando showzinho a la seresta e choro de outrora. enquanto eu lia o trecho de um livro, das ideias de lacan e da questão do desejo, eis que ao lado senhorinhas conversavam alvoraçadas com senhorinhos... elas diziam para eles, em tom eufórico e provocativo, que queriam um homem que cuidasse delas, que fizesse companhia, com quem iam sair para jantar, dar voltas, conversar; algumas diziam que também queriam ganhar colares e pulseiras de diamentes e pérolas... a conversa delongou-se nesse ritmo, entre risos e olhares charmosos que trocavam entre si. eu, ali, quietinha ao lado, e por vezes gentilmente paparicada por elas, ficava pensando... "nossa, acho que quero muito parecido com essas senhorinhas, exceto pelos diamantes e pérolas que dispenso, e eis que estou eu aqui com meus vinte e tantos e elas com seus oitentinhas..., querendo o 'mesmo' e parece que não encontraram".
logo depois, ouvi um senhorinho dizer para uma das senhorinhas: "conheces o terraço itália?", ela respondeu que não. o senhorinho, com seus oitentinha e tantos anos, então dizia: "ah, um dia te levo lá". eis que eu pensava: "nossa, 'um dia', que dia será esse? o que estão esperando? eu, aos meus vinte e tantos já ouvi esses 'um dia' e aquelas senhorinhas, ainda ouviam dos senhorinhos o 'mesmo' 'um dia'... colocando algo num distante indeterminado, era esse o tom do "um dia"...
a questão é que estava ali lendo e pensando justamente na coisa do desejo, e de como ele é de fato indiferente dos objetos aos quais ele se liga, de como é implicado em um significante desprovido de referências.
e eis que escutava das senhorinhas sobre um desejo, o desejo ligado à negatividade, tal qual é, dado que deseja-se a medida que não se tem, e não ter é o que implica a continuidade do desejo... e os senhorinhos, aos seus modos, adiando o desejo, ali, aos seus oitentinha, para aquele tal "um dia"...
enfim... os pensamentos que faziam fundo é que... o que se tem pode ser tão bom, e que é tão avassaladora essa busca incansável por objetos e a sequente insatisfação por eles, ou mesmo a só busca, o nunca acesso... torna-se tão desejado que ruma ao sagrado, intocável... enfim, e de como podemos nos perder nessa procura infindável de algo que não há, e que pode nos cegar das coisas que realmente estão aqui... e que bom que estão...
(fernanda pereira)
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Um comentário:
é... "um dia"!
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